Obstáculos
Agora você pode estar pensando: dormir até tarde me faz bem, comer batata frita me faz bem, beber álcool me faz bem. Afinal, eu me divirto fazendo tudo isso. Primeiro, precisamos distinguir o que nos faz bem do que nos faz sentir bem. Por isso Avirati, gratificação sensorial ou falta de moderação, é um obstáculo: porque nos confunde, nos faz ir somente em busca do prazer. Este não é danoso por si, o problema é o apego que temos por ele. Até o apego a uma prática prazerosa pode ser prejudicial, se formos cada dia com essa expectativa e nos frustramos quando não é correspondida. Nenhum problema em gostar de sorvete de chocolate, mas e se desesperarmos quando não podemos comer? Ou se não conseguirmos comer outra coisa? Ou se comermos mesmo de cama com uma gripe forte e neve lá fora, sabendo que a nossa garganta vai doer depois? Talvez todo esse nosso amor por sorvete de chocolate esteja começando a nos fazer mais mal que bem. É aí que se faz necessária a observação de como reagimos quando não temos o prazer, do quanto estamos dispostos a abdicar para ter esse prazer, o que representa para nós. Porque muitas vezes, mais do que somente a gratificação imediata do desejo atendido, existe algo por trás, algo mais profundo. Tanto pode ser uma emoção com que não conseguimos lidar, em que se come o sorvete por ansiedade, como uma identificação errônea com determinados papeis que assumimos ao longe da vida e dos quais não nos conseguimos soltar. O boêmio, o bom gourmand, o preguiçoso que dorme até tarde, a máquina sexual… Tudo rótulos que nos prendem, mas que ao mesmo tempo nos dão segurança de sabermos quem somos. Sem eles, resta todo um vazio. Afinal, no vazio reside todo o potencial do Universo. Então, a proposta aqui não é ficar na austeridade ou abdicar do prazer, mas entender que esse é momentâneo, o quanto ele nos traz e se vale sacrificarmos algo que em longo prazo nos trará mais benefícios e mais bem-estar.
Um conto antigo narra a história de um homem que se perdeu no deserto. Estava morrendo de sede, quando passou uma caravana da qual saiu um grupo de pessoas, que logo veio ao seu encontro. Ele murmurou: “Água, água, por favor”. Mas as pessoas perguntaram: Queria diretamente do copo ou era melhor do cantil? Ou seria melhor uma xícara? Poderia ser de cristal ou era melhor de prata? Um cálice seria suficiente? Enquanto o grupo se debatia com estas questões, travando uma discussão acesa sobre como seria preferível servir a água, o homem deu o último suspiro, morrendo de sede. Esta história ilustra a facilidade com que nos prendemos a coisas banais e nos distraímos com questões insignificantes. Enquanto nos debatemos com detalhes, ignoramos o essencial: a nossa sede de liberação, o que afinal nos trouxe até ao Yoga. E isso não é algo exclusivo a algumas pessoas, todos nós, em diferentes momentos, passamos por isso.
Texto de Olga Rodrigues
Fotos de Taeko